Por Diogo Almeida
As atividades de muitas empresas envolvem a contratação dos chamados trabalhadores externos, que chegam a passar toda a jornada fora dos limites físicos da empresa, como, por exemplo, representantes de vendas, motoristas ou propagandistas. Esses empregados, portanto, ficam distantes de seus superiores e não se encontram sujeitos ao poder diretivo da mesma forma que seus colegas que permanecem dentro das instalações das empresas.
Os trabalhadores externos, na grande maioria das vezes, não tem uma jornada definida, muitos recebem itinerários rígidos a serem seguidos ou tem a responsabilidade de abordar clientes, fornecedores ou parceiros em certa região, mas nunca há uma limitação para suas jornadas e tem de fazer o possível para encaixar uma grande carga de trabalho na semana, tudo isso sem receber pelas horas extras frequentes.
A justificativa de muitos empregadores para o não pagamento de horas extras é de que o trabalhador externo não estaria sujeito a controle de jornada por atuar fora da empresa, com base no que prevê o art. 62, I, da CLT, no entanto essa exceção se dá apenas quando a atividade externa é incompatível com a fixação de horário de trabalho, o que é muito difícil de ocorrer diante das atuais tecnologias e metodologias de trabalho adotadas para garantir o rendimento dos empregados.
Essa questão é facilmente constatada quando notamos a popularidade de aplicativos de controle de jornada, principalmente em um país em que 66,9% de sua população com 10 anos ou mais acessam a Internet através de seus aparelhos celulares¹, fazendo com que sua adoção para a supervisão dos empregados externos seja fácil e eficiente. Da mesma forma, o estabelecimento de metas, o uso de smartphones com acesso a GPS, a criação de cronogramas de visitas, a limitação da área de atuação de um empregado e a mensuração de um tempo médio de atendimento são meios de se garantir que o empregador estabeleça o que o empregado fará de forma a melhor desempenhar sua função, mesmo que não haja possibilidade de fiscalizar o empregado dentro de um estabelecimento quando achar necessário.
A partir do conhecimento que todo cidadão tem da permanente conectividade virtual a qual estamos sujeitos, traçar um paralelo com a situação do empregado e sua sujeição a essa supervisão virtual se torna algo muito simples. Conclui-se que a cobrança sobre os horários e produtividade do trabalhador externo é a mesma que a exercida sobre os que estão próximos aos superiores, talvez seja até maior com a grande quantidade de informações fornecidas e dados obtidos por tais ferramentas.
Essa possibilidade de cobrança por ferramentas diversas é o que torna inaplicável a exceção do art. 62 da CLT nesses casos, porquanto o controle de jornada não é incompatível, mas sim muito possível, tanto que as empresas efetivamente o fazem, delineando toda a jornada diária do empregado e simplesmente se recusando a estabelecer um ponto virtual delimitando o fim e o início da jornada, mas de resto supervisionando o trabalhador a cada segundo, uma clara manifestação do controle de jornada mas com uma ressalva feita com o simples objetivo de afastar a obrigação de pagar horas extras.
O entendimento nos tribunais, principalmente no Tribunal Regional da 18ª Região leva em consideração essa possibilidade de controle e é categórico no sentido de que o limite de trabalho diário previsto na CLT e na Constituição envolve todos os empregados cuja jornada é passível de controle, não importando se a empresa apenas opta por não fazê-lo:
JORNADA EXTERNA. HORAS EXTRAS. Mesmo se tratando de trabalho externo, sendo possível a fiscalização de jornadas, o fato de o empregador, por sua própria vontade, não exercer o controle, não retira do empregado o direito às horas extras praticadas.
(TRT18, ROT – 0010289-72.2014.5.18.0002, Rel. WELINGTON LUIS PEIXOTO, 1ª TURMA, 07/02/2020)
O que se verifica, portanto, é que a empresa não pode se eximir do pagamento das horas extras dos empregados externos simplesmente porque desempenham atividades fora do estabelecimento, se há possibilidade de controle através da interferência no desempenho das atividades do empregado utilizando ferramentas tecnológicas diversas, ciência de sua localização e possibilidade de saber quando inicia e quando termina a jornada, deverá haver a limitação da jornada às oito horas diárias e quarenta e quatro semanais com o subsequente pagamento das horas extras.