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Os direitos da empregada gestante e considerações acerca da Lei 14.151/21

O ordenamento jurídico brasileiro, desde o advento da CLT, prevê para as mulheres gestantes condições diferenciadas para exercerem labor enquanto estiverem no período de gestação. Além de garantir à mulher uma gestação segura, pelo fato de a mesma possuir estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até 05 (cinco) meses após o parto (Art. 10, Inc. II, Alínea b do ADCT), também é garantida licença maternidade de, no mínimo, 120 (cento e vinte) dias, sem prejuízo do emprego ou do salário da mesma (art. 392 da CLT), podendo ainda ser estendido por Acordo ou Convenção Coletiva.

Dessa forma, é imprescindível ressaltar que é vedada a demissão da empregada que estiver gestante, estabilidade que deve ser respeitada até 05 (cinco) meses após o parto, a não ser que a demissão se dê na modalidade de justa causa, por algum dos motivos que ensejem justa causa para rescisão do contrato pelo empregador, nos termos do art. 482 da CLT.

Insta salientar que a empregada gestante tem o dever de comunicar o empregador, mediante apresentação de atestado médico, a data em que se afastará do trabalho, o que poderá ocorrer entre o 28º (vigésimo oitavo) dia antes do parto até a ocorrência do parto. Os períodos de afastamento, antes e depois do parto, poderão ser aumentados em até duas semanas cada, mediante atestado médico e em outras hipóteses excepcionais, conforme disposto no art. 391, § 1º e § 2º da CLT.

Outro fator relevante e de suma importância a ser levantado é a questão do desconhecimento da gravidez por parte do empregador, fato este que não afasta, em hipótese alguma, o direito à estabilidade por parte da gestante, conforme Súmula 244, inciso I do nosso Egrégio Tribunal Superior do Trabalho.

Súm, TST 244. GESTANTE.ESTABILIDADE PROVISÓRIA

I – O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10,II, alínea “b” do ADCT).

Conforme redação trazida pela Súmula 244, inc. I do TST, observa-se, na verdade, que o empregador não está de fato proibido de promover a dispensa sem justa causa da empregada gestante, porém, frise-se, deverá arcar com uma indenização correspondente a todo o período em que a lei confere estabilidade até o momento da rescisão contratual.

Assim sendo, caso seja confirmada a dispensa sem justa causa no período de estabilidade provisória, a empregada tem direito à reintegração no emprego e, caso seja inviável sua reintegração, serão devidos os salários e todos os demais direitos correspondentes ao respectivo período entre a data da despedida e o final da estabilidade (Súmula 244, inc. II do TST).

Súm, TST 244. GESTANTE.ESTABILIDADE PROVISÓRIA

I – (…)

II – A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade.

Ademais, outra indagação recorrente a respeito da estabilidade provisória da empregada gestante é no caso da gravidez ser descoberta no período em que a mesma estiver cumprindo aviso prévio. Também nesse caso, ainda que a gravidez tenha ocorrido no período do aviso prévio, a empregada tem direito à estabilidade provisória, desde que comprove que a concepção ocorreu durante o período do aviso prévio, e não após seu término.

Tal previsão adveio da Lei nº 12.812, de 16 de maio de 2013, que incluiu o art. 391-A na CLT, conferindo assim estabilidade provisória à empregada que tenha a confirmação do estado de gravidez ocorrido no curso do contrato de trabalho, ainda que durante o prazo do aviso prévio trabalhado ou indenizado.

No mesmo sentido, observemos ainda a situação das empregadas que estão em contrato de experiência ou temporário e que engravidam nesse período. Caso isso ocorra, também elas possuem direito à estabilidade provisória, ainda que a forma de contratação tenha sido por prazo determinado, incluindo, pois, os contratos temporários e por experiência.

Antigamente, o entendimento do TST era divergente, no sentido de que a empregada gestante não teria direito à estabilidade provisória quando contratada por prazo determinado, uma vez que quando o contrato se encerrasse, não haveria dispensa arbitrária. No entanto, tal entendimento foi modificado e a redação do item III da Súmula 244 do TST foi alterada. Vejamos:

Súm, TST 244. GESTANTE.ESTABILIDADE PROVISÓRIA

III – A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por prazo determinado.

Diante do cenário caótico atual, em decorrência do novo coronavírus, o Governo Federal sancionou a Lei 14.151, de 12 de maio de 2021. Essa lei dispõe acerca do afastamento da empregada gestante das atividades de trabalho presencial enquanto durar a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus.

Em seu artigo 1º (primeiro), estabelece que a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem qualquer prejuízo de sua remuneração. Em seguida, o parágrafo único dispõe que a empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicílio, através de teletrabalho, trabalho remoto ou qualquer outra forma de trabalho a distância.

Importa salientar que a Lei 14.151, de 12 de maio de 2021, já foi sancionada e, por isso, é de aplicação obrigatória e imediata a todas as empregadas gestantes, incluindo as domésticas, de modo a garantir tratamento diferenciado no que tange às medidas de prevenção, proteção e combate ao coronavírus, tendo em vista estarem incluídas no grupo de risco. A normativa também considera a necessidade de garantia da manutenção da remuneração da gestante.

Entretanto, mesmo com o intuito de promover as garantias citadas anteriormente para as gestantes, a legislação em comento já trouxe impactos nas relações de trabalho, causando certa polêmica e levantando pontos controversos. Dentre eles, é possível citar: a responsabilidade pelo pagamento da remuneração à gestante durante o período de afastamento e o possível aumento da discriminação para contratação de mulheres.

Em relação ao primeiro ponto de controvérsia, tomando por base o princípio da função social da empresa e o fato de que o risco do negócio compete exclusivamente ao empregador, a obrigação pelo pagamento da remuneração será dele, enquanto não sobrevenha lei posterior com disposição contrária.

Dessa forma, a omissão legislativa acerca da responsabilidade do Estado pelo pagamento da remuneração, do período de afastamento das empregadas gestantes que não tiverem condições de executar suas atividades laborais por meio remoto, teletrabalho ou à distância, de modo a imputar a responsabilidade ao empregador, poderá produzir reflexos, como por exemplo, a  discriminação da contratação da mulher em idade fértil.

Os dois lados irão se digladiar, uma vez que há a necessidade de proteção da mulher e do nascituro e, em contrapartida, a alegação da hipossuficiência econômica por parte do empregador, em decorrência dos impactos causados pela pandemia do novo coronavírus.

Por fim, apesar da grande repercussão e polêmica envolvendo a Lei 14.151/2021, cumpre destacar que a mesma entrou em vigor na data de sua publicação,13 de maio de 2021, não possuindo efeitos retroativos. Restou determinado que, para as empregadas gestantes que possam desempenhar atividades à distância, não haverá a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho ou redução de jornada, sendo vedada a redução do salário, de modo a adotar norma mais benéfica à empregada, sendo mantida a remuneração com seu pagamento integral.

 

Dr. Guilherme Alcântara

OAB/GO 58.861

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